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OUVIR E ENTENDER MÚSICA PARTE 4 Tipo compositor e as ligações

Coelho De Moraes baseado na obra de Aaron Copland

 

O ouvinte com veleidades ou devaneios românticos parece gostar mais do compositor de inspiração espontânea que aparece nos filmes e livros, como Schubert ou Hugo Wolf. Muita vez começa a trabalhar com uma composição completa escrita na cabeça, como Mozart, e não com um tema escolhido. Mas, é certo,  trabalhavam, os primeiros, com formas simples: Concertos e lieds ou canções onde o improviso pode ter lugar quase que obrigatório.

Ainda hoje tem gente que diz que improviso não é música de valor. Tais pessoas devem entender que o improviso é música que não foi escrita. Só. Como a historia oral dos primevos. Não se escrevia e a historia era relatada em volta da fogueira.

Improviso é uma forma de fazer música.

Se é mais fácil ou menos fácil executar fica por conta de cada um.

No entanto, é mais difícil improvisar em Sinfonias. A música solista se presta, até,  para improvisos onde e muito do executante está ali presente,  do que as supremas catedrais da composição onde quase tudo do compositor está ali presente. É claro que no renascimento, ou barroco era possível, dentro da estrutura musical em concerto, que musicistas de estatura, spallas de naipe, tivessem a permissão para criar desenhos e melodias, sem fugir do ambiente sonoro ora em desenvolvimento.

Beethoven é o tipo construtivo de catedrais. Um pedreiro de poder inegável. Chefe de obras que manejava e comandava suas invenções. Beethoven era RPM – revoluções por minuto. Cada sinfonia foi um passo em direções diferentes e sempre inovadoras. Inicia na cola dos mestres e na nona vira o mestre supremo. Qunado adentra os quartetos já vislumbra o atonalismo. Beethoven era pedreiro e profeta. Prometeu era ele mesmo. Nem todo mundo pode. Nem todo compositor é assim.

Há sempre, porém, um processo de criação. As idéias são anotadas, escolhidas, selecionadas, coletadas, substituídas, por muitas vezes. Beethoven começava com um tema, partia de idéia germinal e construía sua obra, após.

Bach e Palestrina eram compositores tradicionalistas. Viveram em um tempo em que o estilo atingia seu apogeu. Então tratava-se de criar música em estilo já conhecido e aceito, apenas trabalhando para fazer superar o que já estava pronto. Levar o estilo ao auge.

No caso de Schöemberg, dando um salto de séculos, temos o tipo pioneiro, era criar do nada um sistema novo, novíssimo, com a codificação de nova linguagem. Surgiu aí o serialismo, o dodecafonismo. Leitura de uma época. Ele mesmo dizia que aquilo que acabava de criar, novo para ele também, não era fruto de seu capricho mas era a percepção histórica do caminho que a musica seguia. A música e a humanidade.

Schubert e Beethoven buscavam a originalidade.

Wagner dizia: - Dê-me três notas e eu construo uma ópera.

Mozart, Bach e Palestrina melhoraram o que já encontraram pronto.
Gesualdo, Berlioz, Mussorgsky, Debussy, Edgard Varèse, eram heterogêneos em suas idéias, viveram em épocas diferentes, mas foram pioneiros e criadores de novos estilos e misturavam vários deles. ‘Fusion’ da época.  Experimentais, à caça de novas harmonias, novas sonoridades, novos princípios formais.

O compositor, observando suas idéias, as quer ligar, dando organicidade e continuidade à composição. Para tanto ele levará em conta o uso das pontes.  Caminhos inter/ideias.
A ponte é o material intermediário de menor valor e qualidade, servindo apenas como elo entre os temas. Claro há que determinados compositores criaram pontes que são obras primas em si mas na observação da peça no todo vemos que não passam de pontes.

O critério do alongamento é outro objeto útil para a  composição, muito usado por Wagner, por exemplo. Há, sempre, o desenvolvimento do material escolhido. O mesmo material toma formas diferentes ao longo da peça.

Em suma, temos: idéia germinal (a semente de tudo), a adição (soma) de idéias menores, o alongamento das idéias (as pontes) e o pleno desenvolvimento (variações temáticas ou tonais) das mesmas idéias.

Cabe ao compositor organizar esses componentes de modo a dirigir o ouvinte no desenrolar de sua história ou música. É uma composição. Tem vários segmentos seguidos de pausa ou não. Pode ter vários movimentos que constroem mundos diferentes. Pode ser num movimento único.

O trabalho deve ser feito de tal forma que o ouvinte não perceba, muito claramente, onde começa a inspiração e onde começa o trabalho braçal do compositor.

Tchaikovisky dizia que 10% era inspiração, e o resto era trabalho braçal. Transpiração. Do seu copista, principalmente.

Em resumo: A solda dos componentes do comboio não pode estar perceptível.
É lógico que o compositor pode lançar mão de moldes prévios que evoluíram com o tempo: valsas, danças, sonatas, fantasias, rapsódias, fundi-las e mutá-las,  e uma série de outras formas à sua disposição, além do material de seu país. Mas toda invencionice tem que mostrar critério ou então se torna lançar notas ao ar e o que cair na pauta é música. Pode até ser contanto que já seja esse o critério e o compositor  terá que admitir que jogou as notas para o alto.

Quando o compositor diz que a música foi feita no modo sonata ele expõe o critério.

Buscar a grande linha. Buscar a coerência. Buscar os critérios. Buscar o sentido de fluência, de continuidade que liga a primeira à última nota. Buscar a leitura e a novidade.

Se for para ouvir o mesmo ligue o rádio. Toque o CD de sempre.

Na verdade, esse é o desespero maior de todo o compositor. É como um Amazonas feito pela mão humana.  A música tem que fluir. Ela pode nascer numa tromba d’água ou no filete de uma fonte.

Para quem tem talento: diversão.

Para o que tem menor talento: sofrimento.

Boito dizia que enquanto ele suava, chorava e se mordia para fazer aparecer um pequeno tema, Verdi, o revolucionário Giusepe, de Othello e Falstaff, já terminara sua obra e começava outra com gênio e beleza.

Hoje devemos ouvir: Chiquinha Gonzaga, Ernesto Nazareth e o violino de  David Oistrach.

 

ADAO & EVA NO DIVÃ

COELHO DE MORAES

Eis  interpretação alternativa... – pois nada, nadinha é coisa absoluta -...  alternativa à famosa estória que nos remete a etapas do desenvolvimento mental do humano, que ao nascer ainda não possui a consciência desenvolvida, pouco percebendo as coisas que o cerca; obedece sem questionar as orientações do Progenitor (Pater Theos). Ou então, o que é pior, trama e urde nas trevas do desconhecimento e da falta de competência,  permanecendo no Éden sem ter talento para isso. Puro vício.

Adão e Eva criados. Com o passar do tempo, o teórico casal bíblico (lembrando que bíblia é sinônimo de coleção de livros, apenas)  inicia comportamento questionador e se mostra casal consciente do que vê no mundo à sua volta. Primeiro Adão percebe que além de covarde é inepto. Nem para comer a maçã serve. Tem que receber na boca. Parecem adolescentes. O Pai os  declara aptos a seguir suas vidas sem a sua divina proteção. O casal deve se estribar em bom judiciário e amplos sorrisos.

Adão e Eva estariam aptos a viver com os outros seres do Orbe? Poderiam viver como mortais antes de comer do fruto da árvore do conhecimento? São perguntas que ninguém responde.

Quando Adão e Eva foram criados do barro (material orgânico)  e das enzimas - pois não passam de seres construídos e nada nadinha naturais -  Pater Theos lhes dava tudo que fosse necessário à vida, só pedia em troca  a Fé. Mais especificamente, que não tomassem contato com o conhecimento do bem e do mal por conta própria pois seria perigoso. Transformar-se iam em deuses eles mesmos. Ora, para que serviria a Fé se Adão e Eva tinham relacionamento direto com Deus, portanto, sabiam dele, o conheciam, e, por conhecê-lo não necessitavam de provar a  Fé? Além do mais nada tinham que fazer no Jardim. Limitavam-se a posar para fotos e solenidades ocas. Chamar rio de Rio. Declarar que nuvem era Nuvem e assim por diante. Nomear o que não tinha nome.

Então, a pegadinha, em Gênesis 2:16 e 2:17: Ordenou o Senhor Deus ao homem, dizendo: De toda árvore do jardim podes comer livremente; mas da árvore do conhecimento do bem e do mal, dessa não comerás; porque no dia em que dela comeres, certamente morrerás. Provou-se mais tarde que não havia morte alguma. Pura mentira do Senhor. Alguns exegetas afirmam que a Morte é simbólica e pretende significar a perda da ingenuidade natural ou pureza original. Forçam a barra.

No começo dos tempos, citando Gaiarsa, era proibido ter conhecimento do Bem e do Mal. Nos dias de hoje as religiões e a política (sucedâneo obrigatório)  desejam que saibamos discernir entre o Bem e o Mal se não nos damos mal. Se fosse possível o treino no passado hoje a coisa seria muito mais fácil. Mas, os primeiro sinais de autoconsciência aparecem;  os obstáculos demonstram a incapacidade. Dar nome para a COISA é fácil. Difícil é saber para que serve a COISA.

Outra pegadinha: Gênesis 3:5  A Serpente fala e pelo visto bem sabe do que fala : Porque Deus sabe que no dia em que dele comerdes (o fruto da árvore do conhecimento) abrir-se-ão os vossos olhos, e sereis como Deus, sabendo o bem e o mal. Outra, em seguida, em Gênesis 3:6: Então, vendo a mulher que aquela árvore era boa para se comer, e agradável aos olhos, e árvore desejável para dar entendimento, tomou do seu fruto, comeu, e deu a seu marido, e ele também comeu. A mulher saiu na frente na busca do conhecimento. Nada desse negócio de intuição. O legal era saber ali na batata, no duro, sem mais nem menos. Nota-se que o humano, então,  olha para si mesmo (reflete): consciência da condição e da individualidade.

Deus, meio brabo, suspende todo o privilégio do casal, o que denota uma tendência à fúria da divindade o  que mostra certo desequilíbrio e descompensação.  Anuncia (para quem? Para os anjos?) que Adão e Eva enfrentarão desafios que são, na verdade, as coisas da vida cotidiana, para ver onde aperta o calo.  Consciência autônoma ao  livre arbítrio. É como se Deus dissesse: - “Vão e construam a civilização!”

Provavelmente, apesar de que não há maneira nenhuma que possamos provar,  a partir desse momento cessa a relação moral de Deus com a humanidade. Deus lava as mãos. Foi embora com suas trombetas para os confins dos Pralayas. Algo que de tão inexorável se torna inútil para a vida comezinha. Não interessa nada saber do infinitos se tem conta de luz para pagar amanhã.

O repórter bíblico no diz o seguinte: Gênesis 3:22: Então disse o Senhor Deus: Eis que o homem se tem tornado como um de nós (nós quem? Que plural é esse? Ele  falava dos elohim? Dos anjos subidos e caídos?), conhecendo o bem e o mal. Ora, não suceda que estenda a sua mão, e tome também da árvore da vida, e coma e viva eternamente. E, tendo tais palavras saído da boca de Deus é, portanto,  possível que o humano se torne eterno. Não é possibilidade descartável.

Será essa árvore o genoma que se vem decodificando? Até vejo os elohim dizendo em coro: - “Mas quem mandou criar esses caras? Agora, segura o rojão, meu”.

O “processo de criação da espécie humana" não se realiza no instante em que Deus cria o homem do barro e a mulher de sua costela (isso segundo a visão patriarcal; há eruditos que afirmam que a palavra que traduziram por costela pode ser traduzida por célula, um pedaço do outro, uma parte do código genético, sêmen e por ai vai. Outros, não patriarcais, afirmam que houve separação do ser duplo em dois, ou seja, tanto Eva saiu da costela de Adão quanto Adão saiu da costela de Eva; depende de quem conta a tal da história ou estória. Se isso for crucial para a existência e manutenção de qualquer religião, estamos mesmo feitos). 

No decorrer de toda a história humana no Jardim do Éden, começando com sua individualização espacial (circunscrição física) através do barro, passando pela individualização da consciência pelo ato de comer o fruto proibido; acarretou a expulsão e deu início ao retorno ao Paraíso ou à busca da felicidade perdida. O que viesse primeiro.

A serpente é uma antiga divindade da sabedoria no Oriente Médio, portanto não surpreende que nesta história haja a presença dela junto à árvore do conhecimento. Como o europeu sempre odiou e chamou de Mal o que vinha de África e Oriente, deram a  pecha de diabólica para a serpente, mas o que é um Seraphin se não uma serpente? Serafim, seraphin, serápis, serpente.

Anjos e arcanjos, querubins e serafins,m serpentes emplumadas.

EM IGREJA OU ESCOLA NÃO HÁ TEATRO

COELHO DE MORAES

Quando escrevemos sobre teatro já engatamos a marcha para falar de critica, de reflexão, de pensamento, de reação, de catarse, de caimento de ficha (intuição). Quando falamos de religião já posamos de doutores do conformismo, professores do comodismo, da formatação, da lavagem cerebral e da vitrine do status quo.  De maneira nenhuma uma coisa pode se confundir com a outra. Nem mesmo as escolas fazem teatro (fundamental e ensino médio) pois ainda ai há a resquícios da  conformação. Nessas atividades, nesses lugares, não há crítica (o diretor não permite);  não há reflexão (a escola não permite);  não há criação (pois as professoras acham que Xuxa e outras sacerdotisas são ainda referência importante). Talvez sejam referência daquilo que não se deve fazer.  

Daí que grupos de jovens de Igreja em nenhuma momento fazem teatro;apenas repetem o que o padre ensinou, o catecismo, a ordem dada, o já pensado por terceiros. Não há reflexão, mas há mímica, pantomima. Para os que ainda não entenderam a ação de REFLEXÃO desemboca em mudança de pensamento por aquisição de novas informações retroalimentadas ou, na fundamentação da verdade; sabemos que em religião ou filosofia não há verdades. Pode existir a busca delas mas não se chega a lugar algum. Navegar é preciso. O problema da religião, diferente, da filosofia, é que ela, inspirada por entidades intangíveis, afirmará a verdade que lhe interessa. Não há teatro sobre isso, portanto. A cada dia de apresentação se nos apresentará uma determinada verdade.

Sugerem alguns estudioso que há teatro para fins múltiplos.  Há encenações teatrais para a diversão, ou instrumento político, ou que buscam consolidar regimes ou ideologias nacionais, ou ainda os grupos comerciais, e, pasmem, o teatro religioso.

É fácil discutir Teatro e Religião. Começa que um nunca é o outro. Pode-se solenizar e se montar cenas santas e sacras mimetizando um acontecimento. Longe disso ser considerado interpretação e releitura de assuntos sacros pois tais assuntos são inquestionáveis. O teatro é questionamento.

Apesar de ter nascido na Hélade, supõe-se, com Téspis e turma em celebrações orgiásticas dionisíacas  (essa parte gostosa a igreja não permite), uma coisa não tem nada a ver com a outras pois Téspis não fazia teatro. A construção do teatro como questionador da moral e costumes e dos deuses foi processo / é um processo. Nada que seja  estável e que deva obediência a entidades superiores como igreja ou escola, pode produzir qualquer tipo de coisa que seja TEATRO.  Pode ser um espetáculo para falar do mesmo mantendo a coisa do jeito que está. Pode até lembrar teatro pois é feito em auditórios e parece coisa de  teatro, apesar das roupas cetim. As pessoas querem brilhar mais do que sua próprias luzes.

 Apesar de Anchieta ter escrito uma obra para encenação – ludus cênicos – comprova que a doutrinação (lavagem cerebral)  era matéria de primeiro interesse e não o questionamento em si: - Será mesmo Deus o deus de todo mundo ou será Tupã?

Onde houver a palavra NÃO  o teatro não existe.

O teatro como  força viva é transformador. Se for conservador não é mais teatro. Sobre o teatro dizem de tudo. Entretenimento, diversão, e, talvez agente portador de mensagens morais. Essa parte já é pertencente ao uso da cultura como meio de dominação das massas. O teatro não se presta a isso. Ele é dinâmico e móvel e se auto/transmuda. Para o teatro, como diz o poeta, não servirá o apontar caminhos, mas servirá bem apontar uma porta e dizer, por ai é que não vou. Não se tem certeza para onde se vai, mas, se tem absoluta certeza para onde não se deve  ir. Dessa forma já começamos a pensar teatro.

Quando a Igreja usa o teatro amador para  agregar jovens, já se pode ficar de orelha em pé pois há ai uma manobra para controle das massas e das jovens mentes.  As tribos devem ser moldadas segundo a idéia do livro ou do pastor. Teatro amador (em geral aplicado por curioso, sem formação técnica alguma) é caminho para a formatação das mentes (que chamam, de maneira equivocada de  atividade para a formação mora e social  do indivíduo). O ideal seria abalar as estruturas.

O teatro não vem trazer a paz e se querem, ainda,  citar Jesus nessa coisa toda falem daquilo que sempre é escondido por pastores e padres e lideres religioso. Jesus disse: eu não vim trazer a paz, mas trazer a espada. Não há tolerância alguma, especialmente entre iguais, mas entre os menores e menos aquinhoados de reflexão até pode ter tolerância,  mesmo por que não haverá competição nesse campo. 

A atitude da Igreja será sempre a de controlar e educar segundo sua maneira de ver a verdade, em geral, subserviente ao estado e às punições divinas. A Escola fará o mesmo basta ver que se estuda de acordo com uma cartilha pré-preparada por professores ditos especialistas. Mas me pergunto, o que fiz na Universidade esse tempo todo que não consigo nem fazer uma cartilha ou traçar uma linha de pensamento e construir a aula que me parece adequada? Por que o Estado deve dar a linha? Por querer controlar as pessoas. Vai que todo mundo resolve parar de pagar impostos. Só pode ser por que o Estado e Igreja desejam conduzir o fiel para ‘o bom caminho’, ou seja, obedecer aos poderes e nunca se rebelar... por que?

Por que, pensam eles,  isso é coisa de artista criador e essa gente tem que ficar de cabresto curto, meu.

 

A personagem é quem fala

Uma boa história começa pelos seus diálogos, pois tão importante quanto á ação dramática que se desenrolará e pela qual se contará a história, a maneira pela qual a personagem se expressará, determinará o sucesso ou fracasso da trama. Ninguém fala igual ao outro, portanto, na obra dramática, não existe espaço para que personagens entoem as suas falas de forma discursiva e professoral, a menos que seja a sua característica, pois, afinal, ninguém anda pelas ruas falando desta forma.

A maneira como a personagem fala, também faz parte de sua caracterização, e deve condizer com aquilo que vemos em cena, não é só o figurino, os trejeitos e etc e tal, as suas idéias e convicções são expressadas e levadas ao público, através de seus diálogos e, palavras mal colocadas na boca de uma personagem, além de soar falso, acaba descaracterizando-a e coloca toda a intenção de contar uma boa história em risco.

As idéias e convicções do autor, não podem e nem devem se valer de uma personagem para serem repassadas ao grande público, pelo menos não da forma que o autor pense e fale. A boa construção de uma personagem, incluindo aí, a maneira pela qual ela se expressa, é que levará ao público, tudo aquilo que o autor acredita, nada pode ser forçado. O autor não deve fazer uso de discursos panfletários e nem usar de tom professoral para passar sua mensagem, aliás, se você conhece um professor, sabe que nem ele é tão didático quando conversa com seus alunos.

A construção da personagem é o alicerce principal de uma história, pois é ela quem se comunicará com o público. O autor, quando da construção da sua personagem, precisa ouvi-la, deixar que ela se expresse da maneira que sua característica fique clara quando ela for abrir a boca para falar. Em alguns trabalhos dramáticos é possível ver de uma forma bem nítida esse problema de construção da personagem. É só você prestar atenção em alguns diálogos das novelas que estão em cartaz, que você entenderá do que estou falando. Nem o ator que interpreta a personagem, acredita naquilo que está falando, tudo soa inverossímil demais.

Não adianta nada ter uma boa história, boas seqüências de ações dramáticas, cuidar do cenário, ou da filmagem, ter uma trilha sonora bem cuidada, ter ensaiado exaustivamente seu papel, se quando a ação transcorre, a personagem fala de uma maneira que não corresponde ao seu comportamento. Há de se prestar a atenção na boca de quem se colocará cada assunto, pois nem todo personagem tem condições de falar o que o autor quer, da maneira que o autor deseja.

Dramaturgia não é assim tão simples, demanda muito trabalho de pesquisa de assuntos e comportamentos. Não basta ter uma idéia brilhante, uma vontade enorme de escrever, se não souber fazer com que a sua personagem fale por ela e não por você. O maior segredo da dramaturgia é justamente a habilidade que o autor tem para colocar os diálogos certos na boca das personagens certas, quando isso acontece, é sucesso na certa.

A indústria da pirataria

Nos dias de hoje, tudo parece estar de ponta-cabeça, é como esses tempos modernos tivessem afetado as pessoas de uma tal forma, que alguns conceitos daquilo que se julgava certo ou errado, não fazem mais sentido. Vivemos tempos de, tudo quero, tudo posso e, nada será proibido. A filosofia de levar vantagem em tudo parece que grudou na pele feito tatuagem.

 

São tempos de enormes paradoxos. De um lado, o discurso do politicamente correto que se ocupa em vigiar a criação artística, do outro, a prática de comprar produtos piratas para levar vantagem financeira. E quem acaba pagando a conta? O artista. Que, ao mesmo tempo, que vê o que criação sendo vigiada de um lado, acaba vendo sua obra sendo pirateada de outro.

 

A indústria da pirataria corre livre aos olhos de todos. Em cada esquina de cada cidade, deste país, tem um artista tendo sua obra pirateada descaradamente, e ninguém faz nada! Volte e meia uma notícia de um combate aqui, de outro combate ali, mas nada eficiente, e sabem por quê? É simples: Quem dis-cursa pregando o politicamente correto, escolhe nas bancas dos camelôs, os lançamentos piratas de CDs e DVDs que ás vezes ainda nem estão à venda.

 

Esses praticantes do politicamente correto fazem parte das pessoas que vivem num eterno paradoxo, pois não são capazes de por em prática aquilo que tanto pregam. O que eles deviam fazer era se ocuparem de combater de fato a pirataria das obras artísticas, os invés de ficar dando pitacos no que pode e no que não pode na criação do artista. Ou será que artista não tem direito de se locupletar com a sua obra?

 

Não haverá combate eficiente que ponha fim na indústria da pirataria, se o cidadão, dito comum, não mudar o seu conceito do que é certo ou errado. Se o preço está alto, se a obra é cara, a culpa não é do artista. Então, por que é ele que tem de sofrer na carne? A pirataria só é benéfica para um lado, o lado do crime, pois é ele que se alimenta cada vez que um artista é pirateado. Depois não adianta se por de politicamente correto e bradar contra isso.

 

A sociedade não pode virar ás costas para o artista dessa forma. A pirataria se combate pelas ações de cada cidadão, que renuncia a oportunidade de gastar menos, desestimulando a indústria do crime e fortalecendo a arte do país. É preciso que cada um tenha em mente, que a arte que lhes diverte é o ganha pão daquele que a exerce.

 

Antes de criticar uma obra artística e se comportar como vigilante do políticamente correto, coloque a mão na sua consciência e repense o quanto você não colabora para o engrandecimento da indústria da pirataria no país. Indústria pirata, todo cidadão tem sua parcela de culpa!

REFLEXÕES SOBRE A ARTE DE ATUAR

COELHO DE MORAES

A experiência com artistas / atrizes / atores indica que pouco adianta adaptar-se de modo submisso ao mundo socialmente construído por terceiros adultos (quando aportamos no mundo ele já está pronto e quando tomamos ciência de que o estamos formando, - se é que chegamos a tomar esta ciência, - já é tarde. Ou desfrutamos ou nos frustramos com o mundo.  O desfrute de viver é pessoal e a observação de quem nem todos desfrutam tem que ser óbvia.  Dessa forma algumas pessoas forçam a aparição de nova realidade via esquizofrenia ou fazendo arte.

O brincar criativo (ludus)  é um modo de se enfrentar a realidade, de  valorizar a alegria de estar vivo mesmo frente a mundo estranho. Frente ao cansaço da sujeição, o brincar com a realidade se apresenta como a possibilidade de criar, de colocar o tom pessoal na experiência, de rearranjar campos. O brincar com a realidade é construir novas realidades, ou, no mínimo, executar novas leituras sobre a realidade media.  Não apenas desmontar a pretensão narcísica, mas impregnar a realidade com o desejo. A submissão poderá nos transformar em normopáticos – as pessoas do quotidiano que acietam as coisas como que naturais - normopáticos marcados por defesas frente às próprias possibilidades, não ousam em pensamentos , nem em palavras e muito menos obras.  Fogem pela vida do medo que visa a  minimização dos riscos que se corre na realidade. Realidade ornada de acasos, e, eivada de riscos improváveis. A realidade não será só tema de sujeição, mas, de criação.

A atriz e o ator são os que se mostram munidos de segurança;  tão firme segurança que impossibilita o acolhimento radical da loucura. Domina-se a nova realidade sem ser invadido por ela. Não sendo assim  não se é atriz ou ator, mas se é louco. Deve-se se abster do autoritarismo e da doutrinação e permitir a fruição, mesmo que aparentemente,  desorganizada da obra que se quer representar ou viver no momento, ou seja, a peça.  O ator e equipe se entregam ao que está acontecendo naquele momento e naquele momento o que está acontecendo é vida e realidade, com ou sem platéia.  A obra que se interpreta – ou que se vive no momento -  é experiência para o ator e para a direção/equipe. Se não for possível experimentar este estado de relaxamento, esta condição de aprendizado ativamente passiva, ativamente expectante, de fato não há aprendizado algum, nem interpretação de nada, nem de vivência de coisa nenhuma.

A atriz/ator, freqüentemente em silêncio, o artista não deve oferecer nem força, nem interpretação alguma, nem forçar poses ou gestos, mas viver o momento daquilo que se quer suposto  representar. Não fazer de caso pensado é ser natural e se quer assim no palco.

A Interpretação será aquilo que a platéia captar, de acordo com seus valores e conteúdos próprios, trazendo para si o valor que souber captar. Sempre dependeremos da inteligência da platéia. Não há como prever reações, a não ser que a platéia seja previsível, portanto, tola. A recompensa por esta retenção de interpretação é o fato de que o ator faz possível interpretação que se pensara da obra, reciclada, então,  pela platéia. Neste caso, a direção/equipe deve trabalhar pela não-ação e pela espera, evitar qualquer atropelamento do ritmo da atriz/ator. O processo não é apenas ativo, não acontece apenas agindo. A ação, aliás, é marca da vida contemporânea - marca não rara ensandecida – e lembrar que ação é drama. Onde houver movimento há drama. Onde houver vida há drama; vida não no sentido ZOE, mas no sentido de pulsação.

O aprendizado vem também com o silenciar, - que não significa parar, -  para ouvir/ouvir-se, deixando passar, deixando estar (let it be), deixando fluir,  permitindo que atriz/ator se desarranjem, se desorganizem, para dos pedaços reerguerem a nave, o casebre, o palácio.  A personagem verdadeira – não uma específica ou certa personagem, mas, a que surgirá dos véus, quase que por si - se constrói aí onde não é tão necessária a defesa. É apenas em estado não integrado que o criativo pode aparecer, emergir. Onde houver densidade o movimento é pífio. Onde houver fluidez pode haver vida.

Ensaios são espaços de desfrute, espaço lúdico, prazeroso; quem faz teatro deve ir aos ensaio para sentir gozos.  Espaço que será partilhado por diretor/equipe/atriz/ator. espaço que invade o mundo interno de todos sem que se tenha consciência plena do que está ocorrendo. Portanto a falta de pudor é condição essencial. Quem tem vergonha ou preconceito deve cair fora desse recinto. Não há necessidade de dizer: “isso é assim”, pois pode não ser. Este espaço é terapêutico, no sentido em que multiplica as possibilidades de vida (drama) de todos,  porque o diretor/equipe não são objeto externo a atriz/ator - o que traria pouco impacto sobre estes -, tampouco são objetos de seu espaço interno - o que seria apenas a experiência com o mesmo. Um olhar em volta do umbigo.

Brincar e criar e atuar e criar a nova realidade, -  mesmo que momentânea realidade que dure hora e meia, - , são, sobretudo, um modo de o diretor/equipe se posicionar diante da atriz/ator, esperando que estes  mesmos possas brincar e criar com e através de seus conteúdos particulares, aprender com estes conteúdos, e, a partir deste conteúdo. Neste caso, não haverá recusa da condição prática humana, do empirismo humano, recusa marcada pelo comportamento defensivo. Diretor/equipe aceitam o conteúdo da atriz/ator, já que  escolheram a estes para o trabalho, aceitam o caos, e esperam, pacientes, o brincar criativo. Não se busca coerência onde não existe coerência, nada se  organiza precipitadamente, nada se organiza do nada. Parte-se de bases ou de proposição de bases. A vivência desprotegida da obra que se quer interpretar ou vivenciar, partindo da obra sem preconceitos ou julgamentos, obra pensada próxima ao brincar, promove o encontro com o  outro e promove o encontro de si mesmo consigo, do ser atriz/ator em verdade, forjando a nova e fluida e momentânea realidade.

Realidade que amanhã será mudada mesmo que a peça seja a mesma.