Artigos Diversos

A arte de se reinventar

Quantos e quantos de vocês já não se depararam com este dilema? Ainda com os olhos debruçados na primeira leitura do texto, entre as primeiras idéias sobre a nova montagem e até mesmo sem saber direito de que jeito colocar aquela história em cima de um palco, se você é ator de verdade, uma certeza se fez presente e você repetiu para si mesmo: terei de me reinventar mais uma vez como ator.

                                            

É, meus amigos, para quem pensava que atuar era só está em cima do palco falando meia dúzia de palavras decoradas, eis mais um pequeno detalhe que faz uma tremenda diferença na vida de qualquer ator: a capacidade de se reinventar em cena. A reinvenção de uma interpretação é o diferencial que mostra a real capacidade que um ator tem para entregar sua vida a tantos e tantos papéis.

 

Pois está sobre um palco, dando vida a tantos personagens, é muito mais complexo do que se possa parecer. Vai muito além de ser alguém talentoso, ou de ser alguém deveras aplicado nas teorias e práticas da interpretação. Tudo isso junto e misturado com a criatividade é o que dá a capacidade para que um ator se reinvente sempre que decide dar vida a um personagem.

 

É assim, a vida do ator é uma eterna reinvenção e quanto maior a capacidade que o ator tem para se reinventar, mais admirado ele é. Pois não é fácil, principalmente para quem está há anos na profissão, dando vida a tantos personagens, interpretar um novo papel sem que este, de uma maneira ou de outra, lembre algo que o ator já fez em outro trabalho.

 

Só vale a pena levar adiante uma montagem, se o ator estiver disposto a se reinventar, tantas e tantas vezes forem necessárias. As mil facetas de um ator, seus infindáveis recursos de interpretação e sua enorme capacidade de se reinventar em cena, são como um verdadeiro colírio para o público sedento por um bom espetáculo.

 

Há tempos deixei para trás esta coisa de ser ator, pois além de não ter nenhum talento para o ofício, ter de me reinventar como ator a cada nova interpretação, me fez mudar de idéia e me ajudou a optar para apenas contar histórias e não mais interpretá-las. Ser ator é muito difícil, pois dar vida ao que o dramaturgo imaginou merece uma capacidade de se reinventar e isso, sempre julguei não ter.

 

Para mim, talvez por ser a minha real aptidão, bem mais simples do que me reinventar em cena, é me reinventar para contar sempre uma mesma história de uma forma diferente. Contribuir com um belo personagem para que o ator tenha a oportunidade de se reinventar, é o que me dá satisfação. Por isso, quando vejo a displicência de um ator diante de um papel, não entendo porque ele optou em fazer algo de tanta complexidade e que demanda tamanha dedicação.

SATED/SP QUER ACABAR COM O TEATRO AMADOR

Assim que abri o jornal Cruzeiro do Sul, no Caderno Mais Cruzeiro, uma bomba explodiu na minha cara ao ler a matéria assinada por José Antonio Rosa intitulada “Impasse com Sindicato leva ao cancelamento do Festival Livre de Teatro Amador”.

Segundo consta na matéria, “o motivo da divergência tem a ver com a regulamentação do exercício da profissão de ator. O Sindicato exigiu que os grupos participantes comprovassem o registro de seus atores e técnicos no Ministério do Trabalho (DRT) ou obtivessem autorização para poder encenar suas montagens.”

- Como assim? – pergunto. – Não se trata de um festival amador? Se o festival é amador, por que os atores precisam do DRT? E por que pagar pra SBAT ou ECAD? Nunca vi tamanho absurdo.

Um parêntese. Sou sócio da SBAT há 15 anos e NUNCA recebi os 10% referentes ao pagamento dos direitos autorais dos meus textos, que encontrava via Google. Sequer era informado a respeito.

Mas um caso interessante aconteceu...

Certa noite estava à porta do Teatro Fábrica, minutos antes de começar meu espetáculo Depois da Chuva... que cumpria temporada naquele local. Um sujeito vem ao meu encontro perguntando se eu era diretor da montagem. Respondi que sim. Ele se apresentou como o fiscal da SBAT e me perguntou se eu havia pedido autorização para o autor do texto Julio Carrara para encenar a obra. Respondi que não havia pedido nenhuma autorização para o autor já que...  Fui interrompido pelo fiscal, dizendo que o autor poderia cancelar a temporada se não pagasse a porcentagem dele, além de estar muito furioso com o fato. “Furioso? Eu? Desde quando? Eu sou Julio Carrara”, respondi. O sujeito não sabia onde enfiar a cara. Se despediu rapidamente e parece que entrou em órbita, porque nunca mais veio me procurar.

Como dramaturgo, cedo gratuitamente meus textos para grupos amadores. Faço questão disso. Então, cara SBAT, não se intrometa.

Agora voltando ao assunto do DRT, vou contar a historinha de como faz para obter o registro de ator.

Para obter esse registro é preciso dirigir-se ao Sindicato dos Artistas, na Avenida São João em São Paulo (agora esse sindicato tem se espalhado pelas cidades do interior como um vírus, pior que o da gripe suína) levando a pasta com os espetáculos amadores que você participou, além de documentos pessoais e desembolsar um salário mínimo.

Abrindo outro parêntese: “Como é possível juntar material de espetáculos amadores, se agora o Sindicato quer acabar com o teatro amador no interior? Por que fizeram essa insanidade com o Festival da ATS? Não faz sentido.”

Prosseguindo: O sujeito não tem grana e se vira como pode: vai trabalhar de garçom à noite tentando equilibrar as bandejas; aos finais de semana, à tarde, pinta a cara de branco, põe uma bola vermelha no nariz e vai animar festinhas infantis, ou faz teatro-escola, teatro-empresa e sei lá mais o que pra conseguir uns trocados até completar o valor exigido. Retorna ao Sindicato para pagar a taxa, aguarda um tempo, e obtém a resposta através de uma voz anasalada:

- Sr. Fulano de tal, seu material foi aprovado.

O sujeito pula de alegria. Mas seu contentamento dura pouco ao ouvir a frase seguinte:

- É provisório. Válido por um ano.

Provisório? Válido por um ano? Quer dizer que no ano seguinte o sujeito terá que fazer a mesma coisa, desembolsar a mesma quantia - ou mais - se aumentar o salário mínimo, pra ter em mãos o seu registro definitivo? Que espécie de Sindicato é esse? 

Mas o sujeito é persistente. Quer levar para o Ministério o documento entregue pelo Sindicato e pegar seu registro provisório.

Só que pra isso ele tem que assistir a uma palestra de capacitação com a duração de 4 horas (quase o tempo de duração de uma peça do Zé Celso), ministrada por dona Lígia de Paula Souza, presidente do Sindicato de São Paulo há mais de 20 anos – o cargo é vitalício? - que num palquinho dá uma “aula” aos novos profissionais sobre a legislação...

Aí vem a história de Procópio Ferreira que foi pedir sua aposentadoria para Getúlio Vargas; da Lei 6533/78, que regulamentou a profissão de ator; sobre contratos, blá-blá-blá e tudo mais. O mais patético são as frases feitas que ela fala como se fossem suas – com certeza deve ter lido em orelhas de livros...

Faltando 15 minutos para acabar a palestra, ela decide entregar o documento. Com gestos largos, chama um por um para pegar o documento, assinar a lista de presença e dar-lhe um beijinho no rosto. Enfim, foi essa maneira que encontrou de estar em cena.

Desculpe-me pela minha sinceridade, dona Lígia, mas a senhora deveria voltar a fazer os filmes em que atuava – principalmente os da década de 80, como Sexo em Grupo, por exemplo – em vez de estar à frente do Sindicato.

Quem quiser ver a esse filme, eu tenho uma cópia, já que o original está muito bem guardado...

A senhora não começou em teatro amador, não? Ou já começou fazendo filmes? A senhora era bem remunerada com esses filmes? Por que sei que no SATED, é. E muito bem remunerada por sinal. Ganha em um mês o que ganho em um ano.

Quem faz teatro amador não recebe nada, dona Lígia (e se recebe) são migalhas que mal dá pra fazer a compra do mês num supermercado ou lojinhas de um real.

Quantas vezes eu tirei grana do bolso – grana que deveria usar para outras coisas, para montar e produzir um espetáculo? E quantos amigos meus e colegas de trabalho, principalmente os de Sorocaba, não fizeram isso? De repente pinta um festival no cu do mundo, sem ajuda de custo, mas o grupo se mobiliza para levar o espetáculo até lá, faz vaquinha pra pagar o transporte e a alimentação, já que a cidade oferece apenas o alojamento. Depois de horas e horas na estrada, você chega cansado, só que não consegue descansar porque tem 30 neguinhos que você nunca viu na vida roncando e peidando ao seu lado no alojamento, que periga ser o IBAMA – isso seria proposital? Talvez sim, porque na cabeça de algumas pessoas, no teatro só existe veado e vaca – enfim, no dia seguinte você dirige-se para o teatro para montar a cenografia, iluminação e passar um ensaio geral. À noite você apresenta o espetáculo e no debate, o corpo de jurados – composto por atores e diretores desempregados, que conseguiram um bico – detona com seu trabalho e sem nenhuma ética, não é mesmo, Sr. Toninho do Vale? Aí o grupo volta pra casa mais desanimado do que nunca.

Se você já passou por isso um dia, parabéns, você é um amador, mas não no sentido pejorativo. Amador porque ama o que faz – apesar de ser uma frase feita, mas que cabe muito bem aqui.

Então fazer teatro amador agora é exercício ilegal da profissão? Mas afinal de contas, que porra de profissão é essa? Com ou sem essa merda de DRT, o desrespeito com a classe artística é o mesmo.

Tenho o registro há mais de dez anos e fiz questão de não fazer parte dos sócios do Sindicato, porque o mesmo só quer saber de receber o pagamento das taxas de contribuição sindical e sequer me oferece uma vaga no Retiro dos Artistas quando eu tiver uma idade avançada e consequentemente, incapacitado de trabalhar.

Falando nisso, alguém sabe me informar sobre o Retiro dos Artistas de São Paulo? Esse projeto já saiu do papel? Por que não se preocupa com isso, digníssima Lígia de Paula Souza, com o futuro dos artistas e não em encher os bolsos de dinheiro? Um dinheiro muito suado, diga-se de passagem, e que o Sindicato ganha na moleza.

Meus amigos da ATS, atores, diretores, dramaturgos e técnicos dos espetáculos “O Ébrio”, “Resumo de Ana”, “A Rainha do Brasil”. “Essas Mulheres”, “Vila Judá”, “O Estrangeiro Misterioso” e “A Sombra da Terra”, vocês vão deixar as coisas como estão? Deixar que esses porcos caguem em cima da gente? Vamos nos mobilizar? Fazer o enterro da SATED, da Lígia, desses nefastos todos que só enchem o nosso saco? Precisamos fazer alguma coisa. Senão, daqui a algum tempo, seremos levados à fogueira.

A crítica gostou, então é bom!

Não consigo entender certos posicionamentos que algumas pessoas tomam diante de certas situações. Por vezes, são até capazes de subtraírem seus gostos, contrariarem suas vontades e irem contra suas próprias convicções, só para seguirem uma opinião. E isso acontece em diversos assuntos, mas vou me ater apenas na questão artística, pois os demais assuntos ficam para uma outra oportunidade.

 

Talvez para agradarem, ou para não se sentirem excluídos de certos grupos, algumas pessoas se deixam influenciar de tal forma por uma opinião, que não conseguem distinguir aquilo que realmente lhe dá satisfação, daquilo que foi induzido a lhe satisfazer. O impulso de compartilhar o filme da moda, a música da moda, os programas da moda, manipulam-na e ela nem percebe.

 

E se tal filme, novela, música, ou sei lá mais o quê, tiver o aval da crítica dita especializada, será a certificação de que fizeram a escolha certa. A opinião da crítica se tornar maior do que a própria opinião que elas tenham ou tinham sobre o tal filme, tal novela, tal peça de teatro ou tal música. A crítica gostou, então é bom!

 

O pior é que muitos artistas andam mais preocupados em agradar a crítica especializa do que as pessoas, e acabam se perdendo no meio do caminho, deixando o que realmente pretendiam realizar para trás, em troca de meia dúzia de palavras de recomendações dadas por uma única pessoa. Acho pouco receber a opinião de uma única pessoa, vocês não acham?

 

O artista faz e leva a sua arte para as pessoas e quanto mais pessoas tomarem contato com a sua obra, melhor. E o ideal é que as próprias pessoas formem suas opiniões sobre o seu trabalho, o aplaudindo, o criticando, o recomendando, ou simplesmente ignorando o seu trabalho. Contar com o gosto de uma única pessoa é prejudicial para o crescimento do artista, pois ninguém é dono da verdade.

 

Tomar como certa ou errada a opinião expressada por uma única pessoa não atesta a qualidade de nenhum trabalho. E se o que você realizou tinha como alvo, um público específico, com um gosto específico, diferente do gosto e da vontade desta pessoa e esta pessoa renega o seu trabalho, você vai abandonar tudo, tendo a certeza do que o que você fez não presta? A opinião de uma pessoa não deve refletir a vontade de uma maioria.

 

O artista tem de debruçar sobre a sua arte, colocando nela, toda a sua verdade, despreocupado se vai agradar esse ou aquele. O que interessa para o artista é a satisfação de realizar a sua arte e se ele conseguir atingir um grande número de pessoas, a satisfação vai ser maior e se dentre estas pessoas estiver o crítico especializado, a realização será plena. Mas, se não, sua obra estará feita e sempre vai encontrar alguém que com ela se comova.

 

Pare de se preocupar com o que vão dizer do seu trabalho, pois alguns vão gostar, outros vão odiar, outros tantos serão indiferentes. Portanto, não dê ouvidos à opinião de uma única pessoa. Seja você o verdadeiro crítico do seu trabalho.

Ninguém é dono da verdade

Quando se atinge certo nível de excelência naquilo que se faz, as pessoas costumam se acomodar sobre alguns louros de vitórias passadas, e passam achar que conquistas de outrora, respaldam eventuais fracassos. Puro engano. Em qualquer profissão, ninguém é dono da verdade. E quando se trata de arte, a arrogância de se achar superior pode ser devastadora.

 

Não se pode achar que, atingindo certo patamar, a pessoa está dispensada de continuar lendo, estudando, se reciclando, que tudo o que aprendeu e já fez, são garantias plenas de novos e vencedores trabalhos, porque não é assim. O pior é que alguns pensam que sim, pois se acham donos da verdade. E a idéia de reciclar jamais lhes vem à cabeça.

 

A troca de experiência entre que está no palco há anos com aqueles que pisam em um palco pela primeira vez, tem efeito renovador e é capaz de sacudir a poeira daquelas teorias ultrapassadas, resgatando por vezes, um entusiasmo que outrora contagiava e que hoje apenas se mostra satisfatório. Não importa quantos anos você faz o que faz, pois nunca saberá o bastante.

 

A experiência do exercício de anos de profissão apenas nos mostra o caminho, mas o aprendizado tem de ser constante. Com cinco, dez, vinte ou trinta anos de profissão, com um, dois, dez prêmios, com dez, vinte, cinqüenta trabalhos, sempre é tempo de se reciclar, até mesmo para não correr o risco de se repetir e repetir os erros de outros trabalhos.

 

Pode parecer um assunto repetitivo, talvez até seja, mas cada artigo escrito é um aprendizado novo, são idéias que estão sendo recicladas e opiniões que foram renovadas por trocas de experiências que a vida nos oferece. E assim é em cada profissão, revendo, ouvindo, reconhecendo os erros, admitindo as deficiências e trabalhando o que se tem de melhor, que conseguimos nos preparar para melhora sempre.

 

E o principal ponto que deve nortear a vida de quem quer estar sempre fazendo um bom trabalho e sendo lembrado pelo que faz, é ter a consciência de que nunca se sabe o suficiente, mesmo que muitos achem que você sabe. Está aberto ao novo e reconhecer que velhas teorias não fazem mais sentido para o trabalho que se quer realizar, só contribui para a evolução e para a excelência de cada novo trabalho.

 

Reconhecer que você já não rende mais o quanto podia render e entender que você não sabe o tanto quanto achava que sabia são os primeiros sinais que mostram que você não é o dono da verdade. Agindo assim, você estará preparado para receber eventuais críticas, sejam ela construtivas ou não.

VENDEM-SE DRT POR UM SALÁRIO MÍNIMO

Isso mais parece nome de novela.

     Antigamente, há mais de dez anos, para ter esse tão sonhado documento, era necessário que o candidato tivesse concluído uma Universidade ou cursos técnicos reconhecidos pelo MEC.

Outra alternativa era passar pelos exames da SATED. O candidato recebia duas apostilas - uma de legislação e outra técnica onde continha informações básicas da História do Teatro e da Literatura Teatral formulada por Haydée Bittencourt, para a realização de uma prova escrita.

O candidato aprovado passava para a segunda fase, que consistia numa entrevista, leitura à primeira vista e a apresentação de cenas, uma dramática e outra cômica – não me lembro se havia monólogo - com no máximo 5 minutos, para a terrível banca examinadora que decidiam o seu destino, numa sala abafada e fedorenta onde aconteciam os testes práticos, (Sala Myrian Muniz – deveriam homenageá-la dando o seu nome numa sala decente que estivesse à altura do seu enorme talento e generosidade. Saudades eternas, grande mestra), do Teatro Ruth Escobar.

Pensam que já terminou? Ainda não. Em seguida, o candidato em questão, ainda precisava assistir a palestra de capacitação (da qual já falei) para então pegar o documento e dar entrada no Ministério do Trabalho, da Martins Fontes, e assim, após algumas semanas, ter a sua carteira de trabalho carimbada e assinada, concluindo parte da odisseia.

Esse procedimento não se usa mais, meus caros. Nem em São Paulo, nem no Rio. Vocês só precisam preparar a pasta com os trabalhos e a documentação e levar ao Sindicato. E, é claro, assistir ao monólogo sobre legislação.

“Vendem-se DRT’s em troca de um salário mínimo.”, com letreiros garrafais e luzes de neon é o slogan do Sindicato caça-níquel…

O que vocês acham de montarmos um show de humor com esse título? Eli Corrêa, Richard Godoy e outros artistas do stand-up, opinem.

E mesmo não sendo Sábado de Aleluia, por que não nos reunimos na Praça Frei Baraúna ou outro lugar qualquer e fazemos a malhação da Lígia, nosso Judas pós-dramático?

Devido à venda do DRT, fizeram de nossa profissão, motivo de piada. Qualquer um pode tê-lo. Basta pagar. Por esse motivo, de uns tempos pra cá, surgiram tantas aberrações no mercado. A televisão está infestada delas.

Se você estiver num espetáculo como “Lisístrata”, por exemplo, e dizer para uma dessas criaturas que Aristófanes está na plateia, é capaz da múmia acreditar e querer cumprimentá-lo ao final do espetáculo.

Não sei se é do conhecimento de vocês, mas se alguém tiver o diploma de uma Universidade onde tenha cursado Artes Cênicas – não sei quanto aos cursos técnicos – é só levá-lo ao Ministério do Trabalho, direto, sem passar pelo Sindicato.

Então se alguém vier com um papo de que você precisa se sindicalizar para pegar o DRT, muito cuidado para não cair nessa: Para ter o DRT não é necessário se Sindicalizar. Você se sindicaliza se quiser. Não é obrigatório. É importante ter o DRT, sim. Se tiver grana para pagar, beleza. Pegue o DRT e não se sindicalize.

Acho importante ter o CCM (Cadastro de Contribuintes Mobiliários) de Artista, que pode ser tirado em qualquer uma das Subprefeituras do Município de São Paulo, pois é através deste documento que contará o seu tempo de trabalho e que garantirá sua aposentadoria. Senão, dá pra tirar em Sorocaba mesmo, o ISS de Autônomo.

Sugiro também que procurem a Cooperativa Paulista de Teatro e se associem a ela. Você paga um valor anual, que equivale a menos de vinte reais por mês, tem advogados ao seu dispor, assim como diversos convênios médicos, cursos gratuitos, seguro de vida e uma série de benefícios que o Sindicato não oferece. E a reunião de intregralização não dura mais de 2 horas. Posso lhes assegurar que serão muito bem tratados. Sou associado há vários anos e não tenho nenhuma reclamação.

Vários sócios da Cooperativa são ex-sócios da SATED. E por esse motivo o Sindicato (Lígia) tenta a todo o custo, prejudicá-la, fazendo sindicâncias para ver se descobre alguma irregularidade e coisa e tal. E isso já dura vários anos, como a eterna briga do Sílvio Santos com o Zé Celso.

A atriz Teodora Ribeiro, da Cooperativa, inclusive, foi agredida fisicamente por Lígia de Paula – viram o nível da fulana? – durante a apresentação de “Palestra de Capacitação”, seu monólogo de 4 horas, que acontece uma vez por semana na sede da SATED. O público, composto por jovens recém-profissionais, presenciou toda a cena. Viram o que acontece a quem ousa interromper o seu monólogo?

O motivo da briga: a criação de outra chapa. Como existe apenas uma chapa na SATED, é evidente que Lígia seria eleita, pois é a única representante. Se houvesse outra chapa, o reinado da rainha chegaria ao fim e a Velha Senhora teria que voltar às suas origens, visitando, quem sabe, os sets de gravação numa refilmagem de “Oh! Rebuceteio”, (Cláudio Cunha, o que acha da ideia?) ou no teatro, com o solo “Nua na Banheira”, numa versão hardcore, de deixar a Rê Bordosa no chinelo. (Angeli, me desculpe.)

Alguém poderia me informar sobre a filial da SATED/Sorocaba, assim como o seu número de associados? Acredito que o quadro é bem pequeno, talvez meia dúzia ou nem isso. E por esse motivo houve esse boicote no Festival da ATS – pra elevar esse número. E agora, dona Lígia? Quem vai pagar os prejuízos referentes à suspensão do festival?

E se preparem porque novos boicotes ocorrerão. A LINC é a próxima vítima e até algum espetáculo que esteja em cartaz na cidade. E é possível que a fiscalização do Sindicato baixe no Cine Dom José, exigindo DRT das strippers; e nas escolas também, para saber se os alunos tem o documento. Se não tiver, não pode subir no palco para apresentar um espetáculo concebido para as aulas de Artes, pois é exercício ilegal da profissão... Francamente, vão tomar em seus respectivos cus, urubus.

A propósito, gostaria que me esclarecessem algumas dúvidas.

1. Qual é o endereço da SATED/Sorocaba? Não faço ideia de onde seja.

2. Quem nomeou Mário Pérsico para presidi-la e por quanto tempo ele permanecerá por lá? Espero que não seja chapa única e cargo vitalício como ocorre na sede paulistana.

3. Que benefícios o Sindicato oferece para a classe? Se continuar como está, precisaremos de convênios na área de psiquiatria.

4. Onde será construído o Retiro dos Artistas? (Preciso ir para lá daqui a algum tempo.) Talvez ao lado do aterro sanitário ou em algum lugar com vista para o ma...to.

5. Haverá casas próprias a preços facilitados, como as que são – ou eram - oferecidas pelo SATED/SP?  Eu não conheço nenhum artista que resida numa casa própria oferecida pelo Sindicato. 

6.Teremos advogados para cuidar dos nossos interesses? Alguns produtores costumam nos dar calotes.

7. Para onde vai o salário mínimo da compra do DRT, assim como a contribuição sindical do mesmo valor, pagos anualmente pelos sócios? Excetuando o pagamento do presidente, claro.

São perguntas que precisamos fazer. Não basta que fiquem cagando regras.

Sorocaba, apesar de ser uma cidade grande, não tem mercado de trabalho. De que adianta os artistas possuírem o registro profissional se não tem onde exercer a profissão e ser remunerado para isso? Temos poucas salas, poucos produtores, muitos sobre(vivem) atuando, dirigindo ou produzindo espetáculos com a verba da LINC e em espetáculos que, talvez, não lhes diga nada. Fazem pelo dinheiro, afinal, precisamos dele para viver. Se algum grupo tem um projeto maravilhoso de uma montagem de “Mãe Coragem e seus Filhos”, do Brecht, por exemplo, sem sombra de dúvida, não será aprovado. Motivo: não fala dos tropeiros e outras personalidades sorocabanas. Mas isso é um assunto que fica para um próximo artigo.

Infelizmente não peguei o auge do teatro sorocabano com montagens antológicas como as de Roberto Gill Camargo, Carlos Roberto Mantovani, entre outros grandes nomes. Mas guardo com muito carinho algumas imagens e sensações da época em que participava do Núcleo de Artes Cênicas do SESI, coordenado por Edeméia Pereira, nos anos 90. Aquele teatro fervilhava de gente. Filas enormes que dobravam o quarteirão, espetáculos com temporada de seis meses. Nunca mais vi isso.

E o Projeto Ícaro? O Festival Tropeiro? E aquelas maluquices (com todo o respeito) do Mantovani? O que era aquilo? Fico arrepiado só de lembrar. Quantas coisas incríveis. E ninguém enchia o saco. Como era bom ser livre.

Mas a ditadura chegou a Sorocaba. E se nos calarmos a coisa vai piorar. Se continuar como está, não dou um ano para os dramaturgos precisarem levar seus textos aos censores para aprovação; para os atores serem arrancados do palco pela polícia, tomarem choque no cu e cagarem no pau-de-arara. Será que teremos que abusar de metáforas como fez Dias Gomes, Chico Buarque, entre outros nos anos 70? Infelizmente o Brasil está retrocedendo no tempo, apesar de todo o avanço tecnológico. A censura está aí. Antes velada. Hoje, quase explícita ou explícita mesmo.

Ah... Outra instituição caca-níquel, além da SATED, veio dar os ares da graça em Sorocaba. A ECAD. E a fiscalização está grande. Você não pode usar nenhuma música num espetáculo se não pagar a taxa. Taxas, taxas, taxas... Daqui a pouco os fiscais estarão nos recintos de festas juninas proibindo o uso das músicas que animam a quadrilha (ou cobrando taxas), você vai receber uma carta de cobrança por ouvir som alto no conforto do seu lar, e não se assuste se aparecer um fiscal na sua casa no dia do seu aniversário e proibir (caso não receba o pagamento da taxa) que seus amigos lhe cantem “Parabéns pra Você”. Espero não presenciar isso. Ah, pessoal, após 70 anos da morte do compositor, as músicas são de domínio público, viu? Orquestras de Sorocaba, como irão se virar?

Infelizmente não estou envolvido em nenhum projeto teatral na cidade de Sorocaba. Mas tenho muitos amigos que estão. E consequentemente foram prejudicados com essa rasteira. E escrevo esse manifesto em nome deles. Se eu, que estou de fora, me senti profundamente agredido, lesado e humilhado, o que dizer daqueles que passaram dias, semanas, meses, debruçados sobre um espetáculo, e de repente viu tudo ir por água abaixo? A vocês, meus queridos amigos, que sofreram esse golpe traiçoeiro, toda a minha consideração e respeito.

Vaias para a burrice, ao egoísmo, às sanguessugas que usam o “poder” para foderem com colegas de trabalho.

Quem cometeu essa insanidade não pode ser chamado de artista. Deveria voltar à escola, se é que freqüentou alguma, para rever alguns conceitos. Onde está a humildade, a generosidade e a ética, hein? Se não ajuda, não atrapalha, porra!

VIVA O TEATRO AMADOR. E exercê-lo, não é exercício ilegal da profissão... SATED, meus amigos, é uma instituição falida!  

Tenho consciência de que posso ser muito criticado e até ameaçado (aliás não tenho medo de ameaças) pelas minhas opiniões. Mas é o que penso. E pelo que sei, ainda existe liberdade de expressão nesta merda de país. Não gostou? Caguei. A carapuça serviu? Reflita sobre. O que não posso, é me calar diante de toda essa pilantragem.

A passividade artística adquirida

Está decretado desde sei lá quando, que os artistas ficarão passivos diante de qualquer situação. Não caberá mais ao artista, ser a voz de protesto, a voz da indignação, a voz da discórdia, a voz da provocação. Não será permitido ao artista, que ele mostre ao povo o que acontece nos porões do poder, que ele fale em escândalos, corrupções ou favorecimentos. A arte deve ser entretenimento, e só!

 

Está decretado desde sei lá quando, que os artistas só poderão usar o humor como forma de manifestação, e mesmo assim, com certas ressalvas. Não caberá mais ao artista, simular, mesmo que de forma humorística, falcatruas, negociatas, dinheiros em meias, cuecas, sutiãs e demais peças íntimas femininas e masculinas. A arte tem de falar de arte, e só!

 

Está decretada desde sei lá quando, que os artistas não poderão mais ter idéias sobre qualquer assunto ligado aos porões do poder. Não será permitido ao artista, músicas de protestos, músicas que incitem a população e que denigram a ilibada e imaculada figura dos homens e mulheres públicos deste país. Música, apenas jingles de campanhas, e só!

 

Está decretada desde sei lá quando, que a passividade dos artistas ora instituída, se tornará condição fundamental para se militar nas áreas da cultura. Só caberá ao artista, sob pena de grave censura e demais penalidades, contar histórias de amor sem cunho político, histórias de humor sem cunho político, qualquer história que for, mas sem nenhum cunho político.

 

Está decretada desde sei lá quando, que os artistas, sejam eles da literatura, da pintura, da música, da dança, das artes visuais, só poderão falar do abstrato, pintar o abstrato, cantar o abstrato, dançar o abstrato, filmar o abstrato. Ao artista está vedado o uso de sua criatividade, de sua ousadia, o seu protesto, a sua provocação. O artista passivo é melhor para todas as artes.

 

Está decretada desde sei lá quando, que os artistas perderam a força, talvez por receio de represálias, ou realmente pela passividade artística adquirida, diante de tantos absurdos, ou ainda pelo simples desânimo de ver que nada parece ter solução. Não parece mais, pelo menos aos olhos do artista, usar a arte como um instrumento de informação à população, nem ser a voz que ecoa e ressoa a angústia por tanta impunidade. O artista já não mais contesta.

 

A passividade que outrora se restringia apenas à população, descrente por um país melhor, parece ter contaminado de vez todos os artistas, seja lá a forma pela qual esse artista se manifesta. Pois a arte está calada em meio a tantos e tantos e outros tantos escândalos, demonstrações de impunidades, de atos ilegais, de falta de ética e de lisura e honestidade.

 

Que o artista quebre essa passividade e volte a fazer da arte, a voz da indignação, a voz da discórdia, a voz da provocação. Que o artista escancare, des-mascare e demonstre à população, que a passividade é arma dos desonestos e dos aproveitadores. Enfim, que o artista volte a ser o que sempre foi.