Artigos Diversos

A aposta no novo

Todos sabem que quase tudo nessa vida está atrelado ao fato de se ter experiência. Se não tem experiência, as chances são mínimas, para não dizer quase nenhuma. Isso é voz corrente em quase todas as atividades. Até entendo que existam certas atividades onde quanto mais experiência, melhor. Mas, será que quando se fala de arte essa experiência é mesmo fundamental?

Como no futebol, que para mim também é arte, mesmo que muitos brucutus queiram fazer parecer que não, o talento que brota dos pés de tantos garotos recém saídos da adolescência é capaz de encantar à todos e a tal falta de experiência não chega a fazer falta, assim, também acredito que no mundo das artes, seja lá qual for, música, teatro, cinema, o talento é que deve ser a aposta.

Por que será que é tão difícil apostar no novo? São sempre poucas, quase escassas, as chances para que algum nome novo possa mostrar o quanto é capaz. Quantas bandas de garagem chegaram ao estrelato ao serem uma aposta de alguém que enxergou ali, em jovens adolescentes sem a mínima experiência, o brilho do talento? E quantos artistas totalmente desconhecidos do grande público, alcançaram o sucesso, pois mesmo sendo nomes novos, mostraram possuir enormes talentos?

Quando alguém resolve apostar em um nome não conhecido do grande público, mesmo que em muitas das vezes ele não seja assim tão jovem e nem tão novato e lhe dá uma oportunidade, quase sempre acaba sendo surpreendido, pois o retorno é quase líquido e certo, até porque, o talento não se mede pela experiência que se tem, muito menos pelo fato de se ser um mero novato.

Acho que a aposta no novo sempre é salutar, pois acaba revigorando, estimulando e dando uma nova direção para algo que andava estagnado. Assim acontece na música, no futebol, algumas vezes no cinema, volta e meia em alguns setores das artes cênicas e em momentos raros na televisão. Por isso, não importa o quanto se seja novato, ou o quanto se tenha de experiência, o que importa é que apareçam pessoas dispostas a arriscar no talento.

Que o talento seja sempre reconhecido e que o novo seja cada vez mais a aposta.

Auto-Ajuda para Atores

Seu problema não é que VOCÊ SE QUER pouco, é que VOCÊ QUER SER muito

Os livros de auto-ajuda tem prosperado muito e, sobretudo, auto-ajudado muito a seus autores que ficaram milionários. Nós que sempre queremos estar na vanguarda das correntes e movimentos e, em vista de que os atores do meio estão um pouco desanimados e deprimidos, queremos aportar alguns conselhos e opiniões para levantar a moral da galera.

1) Valori$e-$e – Fazer teatro, dedicar sua vida a ele é um sacerdócio, com a vantagem de que você pode beber, fumar, trocar de mulher ou de homem, em fim: desenvolver sua liberdade pessoal e manifestar suas forças autodestrutivas. Infelizmente, depois de ter gasto o nosso magro salário em entorpecentes, comida japonesa ou na Serra do Cipó, descobrimos que a nossa arte não é devidamente valorizada;

2) Não chore, quanto mais lágrimas derrame, pior – No País do Carnaval mais conhecido do mundo, pentacampeão, no país que está há vários milhares e pontos acima da fome zero, os governantes não criam leis que possibilitem o desenvolvimento artístico. Um artista, gênio da instabilidade, amante das coisas que ainda não existem, não pode trabalhar nessas condições e muitas vezes a sua sensibilidade o faz chorar. Seja forte, não chore: pense que tudo sempre pode piorar;

3) Ouça a sua Família – Estamos obrigados a falar: muitas vezes a família têm razão! Tem vezes que os pais sabem o que dizem. Por exemplo, quando eles estão putos, é o momento de você ouvir e saber tudo o que eles pensam. Se você prestar atenção conseguirá perceber que em algum momento eles perguntaram: “Com que grana você vai viver?”. Essa pergunta, inexoravelmente, será feita de novo por você no futuro frente ao espelho.

4) Não se sinta inferior – Pense que não existe a inferioridade e no caso extremo de que você seja inferior mesmo, pense pelo menos que essa situação pode mudar. A vida é uma loteria: é impossível ganhar se você não compra algum número. Não se pode viver sem uma esperança;

5) Faça uma dieta saudável – Não seja porco. Se alguma vez vai apresentar alguma peça num festival e fica num hotel com café da manhã, cuidado com a crise de abstinência. Não misture tudo, não coloque a comida no prato como se esse fosse o último almoço do mundo. Cá entre nós, sabemos que ator é um ser com fome. Sejamos discretos. Coloque uma folha, um tomate, não parta para o feijão tropeiro e a lingüiça de primeira. Respire e seja moderado.

Se depois desses conselhos ainda está triste e com dúvidas, é normal. Pense que o nosso grande problema é outro. É mentira que ninguém gosta de você; é mentira que você seja um incompreendido; é mentira que as pessoas falam na suas costas; é mentira que os governantes não se preocupam com você. A única verdade é que ninguém nos percebe, que estamos sós e que queremos um abraço infinito para nos afundar para sempre. Então, por favor, lave o rosto, enxugue as lágrimas, bote um colírio e saia para rua com a cabeça erguida e a dignidade do condenado à morte. Sorria para seu carrasco. Lembre que este é um artigo de auto-ajuda então, se não quer fazer isso por você, por favor, faça o por mim.

O Tigre

68ª Mostra Macu de Teatro

Dia 06 de junho começa a 68ª mostra do Teatro Escola Macunaíma. A partir do tema “Diversão” 43 peças serão apresentadas nos quatro teatros do próprio Macunaíma até o dia 13 de julho. Confira alguns destaques da mostra:

Viúva, porém honesta, de Nelson Rodrigues, direção Lucas de Lucca dias 06/ 07 e 08 de junho; A casa de Bernarda Alba, de Frederico Garcia Lorca, direção Luiz Baccelli dias 10/ 11 e 12 de junho; Meu pé de Laranja Lima, de José Mauro de Vasconcelos, direção Giseli Ramos dias 28/ 29 e 30 de junho; Auto da Compadecida, de Ariano Suassuna, direção Márcia Azevedo dias 01/ 02 e 03 de julho; O cortiço, de Aluisio Azevedo, direção Alex Capelossa dias 05/ 06 e 07 de julho.

Os ingressos custam R$ 12,00 (estudantes e pessoas com mais de 65 anos têm 50% de desconto). Todas as peças terão duas sessões em cada dia a primeira às 19h, a segunda às 21h. Rua Adolfo Gordo nº. 238 Campos Elíseos, São Paulo. Confira a programação completa no site www.macunaima.com.br

Isso não é Teatro

“Os homens criados pelos deuses foram dotados de inteligência; olharam e, naquele momento, sua vista se estendeu e conseguiram ver e conhecer tudo o que há no mundo… Grande era a sua sabedoria; sua visão chegava até os bosques, as rochas, os lagos, os mares, as montanhas e os vales… eles agradeceram, mas o Criador e o Formador não ouviram com prazer.
– Não está bem o que dizem nossas criaturas, nossas obras; sabem de tudo: do grande e do pequeno –disseram.
– O que faremos com eles? Que sua vista só alcance o que está perto, que só vejam um pouco da face da terra! Refreemos seus desejos, pois não está bem o que vemos. Por ventura eles vão se igualar a nós, seus criadores, que podemos abarcar grandes distâncias, que sabemos e vemos tudo?
Isto disseram o Coração do Céu, Furacão, Chipi-Caculha, Raxá-Caculhá, Tepeu, Gucumatz, os Progenitores, Ixpiyacoc, Ixmucané, o Criador e o Formador. Assim falaram e em seguida mudaram a natureza de suas obras, de suas criaturas.
Então o Coração do Céu jogou nos homens uma nuvem sobre os olhos, os quais embaçaram, como quando alguém sopra num espelho. Caiu um véu sobre seus olhos e só conseguiram enxergar o que estava perto, só isso ficou claro para eles.
Assim foi destruída a sabedoria e todos os conhecimentos dos quatro homens, origem e princípio da raça Quiche”.


Popul Vuh (Livro sagrado dos Maias)

I
A Sociedade Secreta dos Caolhos

Se a gente se deixar levar pelos donos do Teatro e da Arte, o teatro não existe.
Reza a lenda que numa inspirada noite de celebração dionisíaca (ou bacanal, como os romanos a chamariam uns seculinhos depois), um cara doidão se afastou do coral que integrava e respondeu-lhe. O coral não deu mole e retrucou; foi o primeiro diálogo encenado da história (pelo menos oficialmente reconhecido). Ninguém sabe por que esse homem fez isso, talvez só tentou ser espontâneo, seguiu um impulso ou simplesmente estava a fim de inventar modinha. Talvez foi improvisado, talvez estava tudo planejado, não importa, inventou o Teatro. Infelizmente para ele, nessa época não existia a patente de registro de propriedade intelectual, portanto, ficou de domínio público. Logicamente que existem divisões, tem o grupo dos que pensam que o teatro não tem dono e os que pensam que o teatro é de todo mundo. Parece que é o mesmo, mas não é.

Os que participam do grupo que acham que o teatro é de todo mundo, pensam de seguinte forma, “se o teatro é de todo mundo também é meu e, se é meu, eu que mando…”, portanto eles se sentem no direito de dizer o que é teatro e o que não é. Por exemplo, quando Sófocles aumentou o número de personagens da tragédia, foi sucesso de público, mas os donos do teatro deixaram bem claro: Isso não é teatro! Foi por essa época que fundaram a Sociedade Secreta dos Caolhos, com o objetivo de fazer do mundo um único país habitado por cegos, onde a Sociedade reinasse para sempre.

Eles se incomodam com tudo aquilo que não é como eles imaginam que deveria ser, não conseguem compartilhar o domínio. Se escondem detrás de autores sempre mais brilhantes que eles e criam muros de palavras, paredes de incompreensão, intolerância e, talvez no fundo, ódio. Ensaiam frente ao espelho várias formas de pronunciar a frase, imaginam a cara de admiração de quem está ouvindo:
- Isso não é teatro, honey!…
- isso não é teatro, bicho!… (risos).
- Isso não é teatro, você não acha?!…

Têm vários tipos de propriedades, pois como os Caolhos mal se suportam entre eles, foram inventando distritos, reinos e um monte de divisões nessa infinita porção de nada que lhes pertence. Existem os donos de um autor, por exemplo, que só eles sabem interpretar, pois se aprofundaram no seu universo (eles adoram criar universos). “Quando Shakespeare escreveu tal frase quis dizer tal coisa”, é a receita que usam para dizer o que eles gostariam de ter dito, mas não conseguiram pensar. Também há aqueles que se diplomaram numa técnica de algum cara que, com certeza, nunca pisou numa faculdade. A frase muda um pouquinho:
– Isso não é clown!
Adoram tecnicismos:
– A máscara não se usa desse jeito!
E comentários inteligentes:
– Tem que esvaziar para a máscara ficar mais neutra, pô!

Os Caolhos se perdem em discussões sobre tamanho – “A minha é maior que a sua!” - e esquecem que a máscara mais perigosa é invisível e se chama Mentira.

Segundo os Caolhos, de toda a produção artística da nossa cidade, 95% dela não é o que diz ser - não é teatro, não é clown, não é Shakespeare - e unicamente 5% cumpre a promessa da verdade.

Dentro da Sociedade Secreta existem os mestres e professores que, ano após ano, repetem invariavelmente as receitas sagradas que constituem a seu parecer o Verdadeiro Teatro, fazem escritos transferindo posses de estilos, assinam diplomas outorgando conhecimento. Asseguram-se de transmitir a ciência de falarem sobre si próprios e espantar a morte aos gritos a seus discípulos que admirados aprendem as infinitas formas de ocultar o sol com a peneira.

O Tigre

Terça Insana e o YouTube

Ontem foi o último dia de apresentação do Terça Insana em Belo Horizonte, em sua turnê nacional "Ventilador de Alegria". O grupo certamente é um dos melhores grupos (se não for o melhor) de humor do teatro brasileiro da atualidade.

A excelente direção de Grace Gianoukas, somada ao talento dos atores e aos textos inteligentes e certeiros que os fazem sair definitivamente da lista de "besteirol barato", transformam sua comédia Stand Up num espetáculo digno de elogios (e muita risada).

O grupo surgiu há 5 anos em São Paulo e permanece até hoje apresentando todas as terças-feiras no Avenida Clube. A cada temporada troca-se elenco, textos e personagens para se formar, como eles mesmos dizem, um "liquidificador de talentos".

Mas a fama rápida a nível nacional aconteceu recentemente, quando suas apresentações começaram a ser vendidas em DVD. Assim, inevitavelmente, foi parar no YouTube.

Muito se discute sobre essa forma de de divulgação gratuita e por vezes até muito mais eficaz do que qualquer outra publicidade. Será que por já ter visto gratuitamente no YouTube, a pessoa não vai querer pagar 30 ou 60 reais para assistir novamente no teatro? No caso do Terça Insana, pode-se perceber na platéia um enorme número de pessoas que estavam ali justamente porque conheceram o grupo pelo site de vídeos e estavam na expectativa de ver ao vivo aquilo que elas já haviam visto no YouTube.

Houveram três personagens que estão presentes no DVD que se reapresentaram nessa temporada novamente, o que causou a prova final do efeito YouTube. Antes do personagem começar a falar, boa parte da platéia já sabia quem eram e o que iriam fazer e ainda sim gritavam frenéticos por estarem assistindo ao vivo. Todos riram de novo.

Os próprios atores fazem piada com isso. Exemplo disso é uma personagem de Grace Gianoukas que fala "pra quem ainda não assistiu o YouTube e não me conhece..."

O grupo foi vítima de pirataria virtual, mas não deve estar insatisfeito com isso, pois boa parte de sua fama nacional hoje se deve à essa "pirataria". Já a gravadora do DVD...

Claro que houve uma pequena frustração do público quando perceberam que não estavam mais no elenco atores como Marcelo Mansfield e Octávio Mendes, que foram os mais acessados no site de vídeos com personagens como "Seu Merda", "Irmã Selma", "Maria Botânica", "Estressado (Eu fico puto)" e outros.

Mas essa frustração foi muito bem remediada com o talento e criatividade do novo elenco. O grupo em geral é composto de pessoas competentes que conseguem sustentar um espetáculo de mais de duas horas com admirável maestria.

Outro detalhe interessante é que são capazes de usar tudo o que têm disponível para fazer piada. Os avisos antes do terceiro sinal, por exemplo, onde todos estão acostumados com aquelas mensagens caretas de patrocínio e instruções de educação, surpreende o público, eles passam a mensagem desejada, mas fazendo piada "...Quem ainda não desativou seu celular junto à operadora, faça-o imediatamente. E para àqueles de menor poder aquisitivo, por favor desliguem os Beeps!..."

Terça Insana é um espetáculo que merece ser visto. Para acompanhar as datas e cidades de sua turnê, pode-se acessar o site do grupo: www.tercainsana.com.br.

O público não é você, sou eu!

Reproduzo aqui um diálogo que presenciei como “papagaio-de-pirata”.

PESSOA CULT: Você devia se envergonhar de levar seu filho nessas peças. Elas são feitas por péssimos atores e são o cúmulo da má produção

ZÉ: Olha, eu não entendo nada de teatro, muito menos meu filho de dez anos, mas se ele gosta eu levo.

PESSOA CULT: Você devia mostrar pra ele que tem coisas melhores. Eu já atuei em várias peças que levam o ser humano a refletir sobre sua existência e sobre a vida. Coisas, profundas, sabe. E não esse teatro superficial que você leva seu filho.

ZÉ: Moça, eu já penso demais na vida quando fico 10h por dia me estressando, pegando no batente e levando o sustento pra casa. Meu filho também tem que ralar na escola e ajudar a mãe em casa, e te garanto que isso faz ele pensar bastante. No sábado eu já não quero pensar, muito menos ele. Queremos nos divertir. E se a peça fosse tão ruim assim não estaria lotada todos os fins-de-semana, não acha?

PESSOA CULT: É porque esse pessoal como você não entende nada de teatro.

ZÉ: Mas o público não é você, sou eu e o povão.

FIM

Ok, temos agora um intrigante paradoxo onde cada parte irá defender até o fim seu ponto de vista. Eu não tenho opinião sobre isso. Não quero ter. Sei que o teatro no Brasil está desprezível, e que mesmo assim o povão adora.

Já diziam os mestres: “É o público quem decide o que é bom e o que é ruim”

Mas quem é o público?