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Trapézio sem Rede

Tatiana Belinky, a dama da literatura e do teatro infanto-juvenil, deu uma ótima definição a respeito do Teatro: “Fazer teatro é como estar num trapézio sem rede.” Pois é, meu amigo. Se você acha que fazer teatro é só subir no palco e vomitar as palavras do dramaturgo, está redondamente enganado. É melhor você mudar o seu foco e dirigir-se para uma outra área. Esta, definitivamente, não é a sua praia. Se quer moleza, camarada, vai entregar pizza (sem desmerecer quem trabalha com isso).

Grande parte dos jovens que fazem ou pretendem fazer teatro, dirigem-se à ele focando num outro objetivo: a televisão. O seu maior objetivo é aparecer na Malhação. É uma pena. Quando elas começam a enxergar que fazer teatro, televisão ou mesmo cinema é mais difícil do que se aparenta, desistem da idéia num piscar de olhos. Todo aquele fogo que sentiam, se apaga. São os chamados fogos de palha.

Quando você está sentado na platéia de um teatro assistindo uma peça, de uma sala de cinema curtindo um filme ou refestelado no sofá da sala vendo novela, parece que a execução de tudo aquilo que está se passando diante dos seus olhos é muito fácil. Parece. Mas não é.

Para uma peça entrar em cartaz são meses de trabalho, um trabalho prazeroso, muitas vezes exaustivo e desesperador até. É um período difícil, porque todos os artistas envolvidos naquele projeto estão muito sensíveis. Quando há poucos dias da estréia, o ator não conseguiu encontrar a linha da personagem, o diretor, quase enfartando e arrancando os cabelos, a produção que ainda não está concluída, a trilha sonora que não chega, os figurinos que não foram entregues pela costureira, as noites mal-dormidas, muitas garrafas de café, cinzeiros cheios, enfim… um misto de euforia e depressão.

E se pensa que com a TV é diferente, sinto-lhe informar que não é. Grava-se muito e em pouco tempo. Você recebe um bloco enorme com os capítulos da semana e grava-se em média, 30 cenas por dia. No cinema grava-se, em média, duas ou três cenas por dia. Tanto na TV como no cinema, o tempo de espera é muito grande. Os atores entram no set por volta das 6 horas da manhã e só começam a gravar perto do horário de almoço. E saem do set por volta das 20, 21 horas, isto é, se a gravação não se estender. Isso é de praxe.

Por isso, se você acha que vida de artista é moleza vai lá. Arregace as mangas, vai decorar texto, estudar uma personagem, malhar em exercícios… Vá e depois me conte!

E não é só isso. Tem muito mais. A maioria dos grupos que conheço e com quem tenho contato, passam pela mesma dificuldade. Grana. Muitos artistas fazem um trabalho paralelo para poder bancar o teatro, além, é claro, de pagarem outras dívidas referentes a moradia, alimentação, transporte, roupas… A galera se une, faz vaquinha pra bancar a produção, se reúne e ensaia em cubículos (normalmente na sala da casa de algum membro do grupo), se der sorte consegue alguns apoios, que barateia a produção, fecha contrato com algum teatro, paga uma parte do valor, dá um cheque caução por garantia, investe pesado na divulgação e finalmente o espetáculo estréia.

E depois, o que acontece? Aí passamos a sobreviver de porcentagem de bilheteria (se tivermos muito público). Dessa porcentagem, pagamos as dívidas da produção, o valor mínimo e a porcentagem do espaço e se sobrar, ficamos com uma parte da grana. SE SOBRAR. Sem contar com alguns fatores externos: ataques do PCC, chuvas torrenciais, greve de metrô, etc., que prejudicam demais o nosso trabalho. Aí a alternativa é trabalhar no vermelho, com a corda no pescoço e correndo o risco do seu nome ser levado ao SPC. Felizmente, comigo isso nunca aconteceu. E espero que nunca aconteça.

“Como eu gostaria de viver de teatro.” É a frase que todos os artistas pensam. Isso está ficando cada vez mais complicado.

A maioria dos grupos que conheço, inclusive o meu, não são subvencionados por tais leis. Não por falta de tentativa, mas porque a tendência é dar grana pra quem já tem. Sempre a mesma “panelinha”. Um grupo ou outro dá a sorte de pegar alguma dessas leis. Mas são raros.

Existem inúmeras leis: o Fomento, a Rouanet, o VAI , entre outras leis. Mas pra que servem essas leis, se são sempre os mesmos grupos que são agraciados? Por que não investir no novo? Por que sempre foram e sempre serão os mesmos a receber subvenção? Até quando vai isso?

É um caminho espinhoso o qual trilhamos. Das duas, uma: ou você tem um amigo fodão responsável pela análise dos projetos, que aprova seu trabalho por camaradagem ou você continua batalhando. Quem sabe um dia, tu não é agraciado por insistência?

Seria bom se somente os aplausos enchessem nossas barrigas . Aí não precisaríamos passar por situações tão patéticas.

E aí, galera da Malhação, vocês têm certeza que querem encarar esse trapézio sem rede?

Palmas, se quiserdes bater!*

Vejo muitos atores em entrevistas dizer: “sempre quis ser artista desde criança”; às vezes sinto um pouco de vergonha em falar, mas este nunca foi o meu pensamento. Nem o da minha família, afinal o sonho dos pais em geral é que seu filho seja um “Dr.” (médico, dentista, advogado). As mulheres até podem ser professora, mas devem se casar no mínimo com um engenheiro.

Foi a partir destes depoimentos que eu comecei a pensar porque eu gosto de fazer teatro. O que me atrai nele? A forma de comunicação, a possibilidade de propor uma reflexão, a chance de viver várias vidas ou o aplauso mesmo? Nem digo ganhar dinheiro, porque definitivamente são poucos os que ganham dinheiro vivendo da arte.

Adoro o frio na barriga minutos antes da apresentação; a expectativa de ver a platéia lotada, a responsabilidade de apresentar um bom espetáculo mesmo em um teatro com poucas pessoas, propor uma “viagem” ao público. Até relembrar os erros que houve durante alguma apresentação pra mim é prazeroso.

As crianças, apesar de que hoje em dia não só as crianças, se empolgam com o glamour da coisa, mas acredito que o teatro é uma ótima oportunidade de informar, entreter e contribuir com a sociedade. Sem contar com enorme conhecimento que adquiro a cada pesquisa para construção da personagem e montagem da peça.

Mas pensando bem se tudo isso vier em um teatro luxuoso, com letreiro luminoso piscante escrito - AUDREY, AUDREY, AUDREY - com um camarim cheio de flores, almofadas de veludo, champanhe e admiradores aos meus pés até que não é uma má idéia.

* William Shakespeare, Sonho de uma noite de verão

Por que as pessoas não vão ao teatro?

Quando fazemos esta pergunta à resposta imediata é: Porque é caro. Realmente algumas peças são caríssimas, mas em São Paulo há diversos tipos de espetáculos. Os gratuitos, que tenho que admitir que há o inconveniente de esperar horas na fila para receber o ingresso, os com preços médios de R$ 15,00 a R$ 20,00, valores similares aos do cinema, os de R$ 30,00 a R$ 50,00, quantia que um jovem gasta numa balada, e os extremamente caros.

Então a minha resposta para essa pergunta é: a falta de habito, assim como a falta de habito de ler. Quem não lê costuma dizer que não tem tempo, mas passa horas em frente à televisão.

Conheço gerente de banco, com nível superior, que quando soube da minha atividade confessou nunca ter ido ao teatro. Não muito distante desta realidade há muitos atores ou estudantes de artes cênicas que também há muito tempo não vão ver uma peça.

Tenho algumas sugestões para aumentar o publico de teatro, é claro que isso será a longo prazo, porque mudar a mentalidade de uma sociedade não é tão fácil assim. Uma delas é a volta das matines, mesmo para os espetáculos adultos, pois com a violência as pessoas evitam o centro das cidades principalmente à noite, isto facilitaria também a vida de quem mora na periferia porque depois de certo horário não há mais transporte publico. Outra idéia seria a abertura de mais salas de espetáculos na periferia e nos shoppings, a “pseudo segurança” aliada à facilidade de acesso aos shoppings já estão incorporados à rotina das grandes cidades.

Além disso é necessário formar a nova geração do publico teatral, as escolas poderiam incentivar e promover mais passeios ao teatro. É bastante comum ver a criançada participando de excursões a grandes parques de diversão, é sadio incentivar as crianças a gastarem energia em parques, mas é bom diversificar as atividades extracurriculares.

Infelizmente não dá para saber ao certo porque as pessoas não vão ao teatro, se é mais confortável ficar em casa e assistir TV ou se a divulgação do cinema é melhor. As vezes o teatro moderno é visto como esquisito que ninguém entende e o clássico cansativo, mas sabemos que quando há atores famosos da TV atrai bastante gente independente do preço e da distancia.

À moda da casa

Alguns programas combinam com determinada comida. Por exemplo: cinema e pipoca, TV e salgadinho, parque de diversão e algodão doce, balada e hot-dog e claro teatro e pizza. Têm peças que pedem uma pizza depois, não é a toa que a maioria das peças tem o apoio cultural de alguma pizzaria ou cantina italiana.

Os gêneros que mais abrem o apetite são: o musical e a comédia. As montagens que levam o público a reflexão, põe o dedo na ferida são extremamente importantes, mas vamos admitir o drama e a tragédia tiram o apetite.

A alimentação além de ser necessário para sobrevivermos está diretamente ligado ao prazer, à celebração. Então para completar a noite agradável, jantar depois de assistir uma peça é uma ótima opção. Como em São Paulo os teatros mais tradicionais ficam nos bairros italianos do Bixiga e Bela Vista, a pizza tornou-se parceira do teatro por questões geográficas.

É comum nos perguntarem: O que você pretende com esta montagem? Qual a mensagem querem passar? Qual a proposta do texto?

Neste programa Teatro e Pizza o mais importante é fazer com que o público morra de rir. Depois do espetáculo enquanto o cidadão saboreia aquela maravilhosa Pizza de Mussarela lembre-se de uma cena, tenha uma crise de riso, que as pessoas nas mesas ao lado não entendam o porquê daquele louco está tendo um ataque de bobeira; que seus acompanhantes lembrem-se da mesma cena comessem a rir também e todos tenham uma noite inesquecível.

O teatro é algo sagrado

Muitos dizem que ser ator é uma profissão como outra qualquer, mas na minha opinião o teatro é muito mais do que isto é praticamente uma religião. A representação teatral surgiu nos rituais de exaltação ao Deus Dionísio.

Não podemos comparar a rotina de trabalho de um contador com a de um ator. Nos dois casos há muito preparo, estudo e dedicação, no entanto assim como os templos religiosos o teatro é uma forma de ritual, um lugar aonde as pessoas vão para aprender algo sobre o ser humano.

Os padres e pastores se desdobram para interpretar a bíblia aos fieis da igreja, seja pela comedia ou pelo drama, no intuito de manter a atenção dos discípulos e transmitir a mensagem da forma mais clara possível.

Já ouvi também relatos de peças que enquanto alguém do grupo não foi pedir “licença” para determinada entidade em um centro espírita a peça não vingou. Parecia até que a personagem, fruto da imaginação do autor, existia e estava exigindo mais respeito à sua imagem.

Apesar de hoje em dia as empresas tentarem conciliar lucro com responsabilidade social, o trabalho em uma sociedade capitalista como a nossa tem como objetivo principal o lucro, claro que nós trabalhadores das artes precisamos de dinheiro; ser ator é uma profissão, mas não como outra QUALQUER.

Nelson Rodrigues não é pornográfico

Por que na maioria das vezes quem monta alguma peça de Nelson Rodrigues opta pelo caminho mais comum de transgressão como, por exemplo, o nu? Os textos de Nelson já são fortes, contestadores e ousados o suficiente para os padrões de uma sociedade cristã como a nossa. Então porque não propor algo diferente do que todo mundo faz e atrair o publico conservador? Cenas “apelativas” só aumentam a opinião do publico, leigo em geral, de que em Nelson Rodrigues só há baixaria. Fazendo com que o drama, o conflito, o desespero das personagens e a mensagem fiquem em segundo plano.

Assisti tempos atrás a montagem de Doroteia do grupo das Dores; Doroteia é um texto repleto de metáforas, uma linguagem que beira o surrealismo, escrito na mesma época que surgia o teatro do absurdo. A atriz que representava a personagem titulo usava um vestido vermelho com fendas laterais – lindo- que já era o suficiente para diferenciar o perfil de Doroteia das demais personagens, pois todas as outras mulheres usavam roupas pretas que cobriam o corpo inteiro de uma forma bem recatada. Mas pelo visto o contraste dos figurinos não foi suficiente para o diretor. Porém aos poucos a atenção do publico foi transferida e o foco da peça deixou de ser uma mulher desesperada querendo ser aceita na família e passou a ser:

A atriz está usando ou não calcinha? Depois de uns passos mais largos que a atriz deu, foi possível a confirmação da ausência da roupa intima. Confesso que fiquei constrangida de ter me desligado do assunto principal da peça, mas por outro lado aliviada por ter sanado tal duvida. Voltei a prestar a atenção na peça, mas então uma vontade incontrolável de ver logo a cena que justifique o porquê da atriz estar sem calcinha surge e esqueço da trajetória de Doroteia e espero ansiosa a cena que justifique a falta da calcinha. Só que a cena não vem.

Não sou nenhuma puritana, mas acredito que tudo que este grande autor escreveu foi para trazer à tona a reflexão de tabus que até hoje são de delicadas discussões e não chocar por chocar. Vamos ter mais respeito à obra e propor soluções criativas porque o mais difícil o gênio já fez. Escreveu excelentes obras e levantou a discussão.